quarta-feira, 30 de setembro de 2009

sapatos importa?

vou te contar uma história que eu não sei o final
ela começa quando não sabemos que iniciou
parece que surge quando repentinamente coçamos a perna e percemos que alguma coisa mudou...
olha só! não estou mais aqui!
agora dependo do outro lado da estação que escolhi
agora, lá do outro lado de mim
não preciso mais fingir nada
não preciso mais dizer que está tudo bem, obrigada!
não preciso mais sorrir o tempo todo mostrando meus dentes tão brancos e tão certos
não preciso mais exibir vestes e panos que paguei aa prestação (que importa?)
não preciso mais mentir pra continuar em frente
não preciso mais desistir pra insistir
nem de espelho eu preciso mais e nem de maquiagem pra esconder minha verdadeira cara

mas agora, lhe digo, companheiro...
o preço que se paga por se viver sem espelhos não tem preço...
porque quando estou indo eles estão vindo com seus carros luminosos, seus olhos brancos e suas mãos imaculadas e limpas
eu tenho terra em algumas unhas ainda porque mexi numa muda que precisava de mim
porque quando olham pra direita e pra esquerda eu olho pra cima e pra baixo
e não importa mais o meu sorriso
ele vem quando eu preciso
e acalma os meus sentidos porque hoje, o meu sorriso está dentro dos meus sentidos

não preciso mais então gargalhar nem exibir como estou feliz
porque isso não faz mais sentido se vivo, e viver é ser feliz.
mesmo que eu não tenha nada nos bolsos no momento (e os momentos vão e vem um após o outro) e minha conta bancária escassa, continuo sendo descalça e calçada.

do outro lado de mim ainda tem portões e janelas fechados
mas olhe só, companheiro, se quiser entrar, me encontrar, só ficar em silêncio que me encontra muito fácil, dessa vez, sem mentira, sem poses nem conto de fadas.
sou apenas eu, do outro lado de eu mesma.

então, nessa história que não tem fim,
me encontro no caminho com meus irmãos e irmãs,
quando durmo, acordo,
quando acordo, durmo.
alguns descalços, posso ver os calcanhares,
alguns calçados, são apenas sapatos...
alguns eles mesmos, olhos em pura doação,
alguns ainda eles misturados, olhos projetados.
todos no mesmo caminho, andando em diferentes sentidos, na crônica do possível impossível.

e do impossível .....possível.

como disse, a história não tem fim.

caminho

era uma vez uma escada de pedra
que subia (quando se estivesse subindo) em degraus desiguais e ciliados de plantas pequenas,
que levava a um outro patamar da estrutura da escada
onde lá em cima abria-se para um verde quintal

era uma vez um quintal de pedra
onde as diversas plantas cuidadas e plantadas com cuidado e carinho ciliava as margens e os limites
onde alguns seres sentavam-se para descansar ou
simplesmente apreciar a temperatura agradavel do quintal de pedra
onde havia bananeiras, comigo-ninguém-pode, arrudas e alecrins, margaridas, canas-de-açucar, marias-sem-vergonha, espinheiras-santas, limoeiros, laranjeiras, rúculas, salsões, entre outros pés e mudas cheirosos, curandeiros e esperançosos, além de visçosos e verdes caules
que de dentro da casa eram observados com paciência

era uma vez uma casa no quintal de pedra
que era toda meticulosa em sua imperfeita montagem
com janelas grandes e desiguais de vidros reaproveitados, paredes expostas na singularidade do concreto bruto, pisos frios que aqueciam quem pisava, cores diversas que entravam com o sol
nesta casa (desigualcasa) tinha um fogão a lenha de pedra
tinha uma mesa de pedra
e tinha alguns seres de pedra (entre outros seres comuns)
tinha um quarto de madeira e uma varanda de mudas e de ganeshas
tinha banderolas tibetanas e nadadeiras muito usadas, tinha uma rede bem velha e alguns sapatos novos
nessa casa desigual, tinha seres desiguais que observavam os seres comuns que observavam os caules e as plantas nascendo que observavam o quintal que observava de cima os degraus de pedra, que olhavam para baixo e viam o mar.

não era um mar de pedras.

primavera não mais

bom dia, primavera!
abro a janela do quarto que durmo e nao enxergo as flores nem as cores que me prometeste
se estão em outros lugares que senão onde vejo, ridicularizo suas promessas de existir depois do inverno.
ó, primavera!
o inverno já foi tão triste e tão frio que cortou ao mesmo tempo muitos dos meus pensamentos e alguns centimetros da minha carne (sem falar no coração arregaçado e nas dúvidas repletas de metonímias).
e agora, a promessa de flores nas cores ou vice-versa nao encontra meus olhos. ou meus olhos estarão olhando em outras direções ou tudo está realmente caminhando para o caos.

na primavera de flores não há pétalas inteiras
na primavera de tempos amenos não há leveza ou brandura nas ações
na primavera de propostas novas não há novidade das respostas
na primavera de outros novos tempos não há tempo para a espera

então é primavera?